O meu contato com a obra de José Saramago vem ainda da Graduação em Letras, meados do quinto para sexto semestre, em finais de 2006. Na época, estava passando por um período de transição para os estudos com o texto literário quando encontrei O evangelho segundo Jesus Cristo (1992), primeiro romance do escritor que eu tive a oportunidade de ler.

Logo minha atenção se voltou para um aspecto quase que unânime e corriqueiro aos que se deparam pela primeira vez com a obra do escritor português: o estilo típico de narrar, que preserva o fôlego da oralidade no trajeto da escrita, fazendo do texto literário “exercício muscular” (usando termos do escritor na entrevista dada a Carlos Reis em 1997), forma escorreita, impossível de à primeira vista precisar momentos de narração, falação ou volição psicológica do narrador e da personagem.

O estranhamento que esse estilo de narrar me causou, forçando-me a reler umas três ou quatro vezes, assim, já de cara, as primeiras páginas daquele romance, foi a voz que me disse "esse é o escritor que irei estudar".

Quando descubro as raízes do escritor e o que sempre traz à tona com seus romances - inúmeras questões das que perpassam e constitui o homem, a existência, a essência, o espaço em suas mais diversas dimensões - me identifico totalmente com aquilo que ele escreve. Conforme disse na post de sua perda, para o blog Letras in.verso e re.verso -, é como se o que Saramago dissesse fosse aquilo que eu sempre quis dizer para mundo, mas não tenho oportunidade e/ou não sou capaz.

O resultado das minhas primeiras observações acerca das leituras da obra desse escritor foi um trabalho de conclusão da Licenciatura em Letras, em que tomando como leitura O conto da ilha desconhecida (1997) como um texto permeado de uma residualidade do Existencialismo, movimento preconizado por Jean-Paul Sartre entre os anos 1940 e 1970, refleti sobre a constituição do ser tendo por matéria os movimentos operados pela personagem central do referido conto.

Depois, veio o trabalho de uma dissertação de mestrado cuja leitura são outras duas obras do escritor, Memorial do convento (1982) e Ensaio sobre a cegueira (1995). E desde que comecei a coletar materiais para a monografia - à época, ainda de difícil acesso - e depois para esta dissertação, que eu já tinha o interesse de criar um espaço para organizá-los; entretanto, as condições nunca me permitiram. Agora, depois da morte do escritor, me vi, como leitor da sua obra, impulsionado a por a ideia em prática e, logo, me prontifiquei a abrir um espaço como este. Trata-se, em linhas gerais, de um projeto que pretende reunir, na medida do possível, a leva de materiais e informações dispersas que eu tenho recolhido sobre o escritor e sua obra.

Concebido com um work in progress Um caderno para Saramago tem um traço explícito de ser um espaço capaz de reunir a maior quantidade desses materiais em torno da vida e da obra do escritor português compondo, deste modo, um extenso arquivo on-line; um extenso labirinto cujo fim pretende-se infinito, transbordante. Esse conjunto de materiais é importante para mostrar também a leva de produções, principalmente do Brasil em torno da obra saramaguiana. Penso nesse espaço ainda como uma forma de utilizar a web, para ampliar, ainda mais, os ecos de seu legado deixado. E não apenas isso. Tem ele também uma virtude para com as relações de leitura-literatura-ensino. Um espaço do tipo visa fornecer a professores e a alunos da rede básica escolar que porventura buscarem informações acerca da vida e da obra do escritor José Saramago leituras e caminhos de pesquisa.

Minha esperança com essa ideia é que ela seja o suficiente para desencadear um movimento de apoio por através dos leitores, pesquisadores da obra do escritor. Entendam todos que este espaço, apesar de nascer de um impulso particular de um pesquisador saramaguiano, é um espaço para ser feito a muitas mãos e vozes, porque a obra de José Saramago está aí para ser lida, aos que ainda não leram, relida infinita vezes, aos que, como eu, já tiveram experiência de lê-la. É assim que se redescobre e se revalida, por através dos leitores e estudiosos da literatura saramaguiana, uma outra vida para o escritor. Espero muitas sementes. Darei prioridade a todo e qualquer material que chegar à minha caixa de e-mails, e à medida do possível, sem pressa e seguindo os protocolos necessários para publicação irei atualizando este espaço.

Abre-se com um título sugestivo de Um caderno para Saramago; um caderno que pretende congregar vozes que têm, entre outras funções, a de perpetuar o grande legado que este escritor deixa com sua obra e pelo qual, nós, os leitores, havemos de zelar. Montei este espaço como um caderno mesmo que tem por função reunir, organizar e facilitar o acesso às publicações e informações sobre o autor e sua obra. Espero os votos de companheirismo de todos os saramaguianos para que esse plano de esperança possa crescer e dar bons frutos.

A todos os saramaguianos, boas-vindas!


Pedro Fernandes
editor do espaço


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